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Black Friday vista por Tomé Moreira

Tomé Moreira
Tomé Moreira
6 min. de leitura
tomé moreira

Depois de uma saída bem precoce do PPS, aproveitei para ir dar um passeio familiar pela marina de Vilamoura no final de tarde de sexta-feira. É nesta altura que recebo um telefonema em que me recomendavam que fosse ao Hotel rapidamente fazer levantamentos dos softwares de poker porque poderíamos estar perante a derrocada do poker online já que havia sido vedado o acesso aos americanos aos dois maiores sites: Pokerstars e Full Tilt.

Pânico

O alarme não foi suficiente para interromper o meu passeio uma vez que os argumentos não me convenceram. Chegado ao Hotel, tentei actualizar-me e mal me ligo ao skype começam a chover chamadas e mensagens. Foi nessa altura que tomei consciência do efeito bola de neve que se estava a viver e que provocava um pânico generalizado nas pessoas.

O que aconteceu na verdade

Fora emitida uma acusação por parte do DOJ ( Departamento de Justiça Norte-Americano) acusando 11 alto responsáveis da Full Tilt, Pokerstars e Absolute Poker de lavagem de dinheiro, fraude bancária e de violação da UIEGA (explicado à frente). Foram ainda emitidas providências cautelares contra 5 domínios e 13 contas bancárias fora dos Estados Unidos.

Mais em baixo, explico a motivação e o contexto destas acções.

Implicações reais e especulações

A implicação imediata desta acção do DOJ foi o cancelamento imediato do acesso dos norte americanos ao softwares de poker por parte das próprias casas. Mas, afectando directa e imediatamente ao resto do mundo, apenas mudou o número de jogadores nestas casas e a alteração do domínio de .com para .eu (agora para .co.uk).

À boa maneira portuguesa, as pessoas começaram rapidamente a especular e a criar várias hipóteses. Vai daí, cada conto acrescenta um ponto e surgiram rapidamente várias teorias, algumas bem criativas que tiveram o condão de desesperar muita gente.

Surpresas

Na noite de sexta-feira estive em 7 ou 8 conference calls. As pessoas não sabiam muito bem o que fazer e apregoava-se o fim do poker online. As que podiam, tentavam retirar o dinheiro dos sites, mas algumas não sabiam como o fazer.

Fiquei abismado quando alguns jogadores ganhadores me pediram conselhos e verifiquei que não possuíam moneybookers nem neteller. E ainda mais admirado fiquei quando soube de alguns que nunca tinham tirado dinheiro, apesar de terem quantias astronómicas nos sites. Isto só vem dar razão a um post anterior em que eu referia que muitos jogadores novos, apesar de pessoas equilibradas e inteligentes, não estão preparados para gerir as suas bancas convenientemente.

Apesar de não ter respostas definitivas para muitos dos problemas e questões, tentei ajudar como pude e colocar algum bom senso na cabeça das pessoas.

Legalidade do poker online

O crescimento exponencial que o poker online tem evidenciado tem suscitado uma crescente atenção por parte dos governos. De facto, o poker gera lucros astronómicos para os sites online, lucros esses que vêm dos depósitos de cidadãos. Como muitos desses sites estão sediados em paraísos fiscais, os governos não conseguem controlar os movimentos e escapam-lhes receitas que teoricamente lhes são devidas.

O poker online continua uma actividade ilegal em muitos países (caso de Portugal) e, a meu ver, as implicações são negativas para toda a gente: os governos não lucram, os jogadores não podem ter uma actividade legal e as casas de poker estão impossibilitadas de se fazer publicitar. Os únicos que parecem ganhar com isto são os casinos que, desta forma, enfrentam uma concorrência enfraquecida.

Alguns países já tomaram medidas. Por exemplo, a Itália e a França fecharam o seu mercado, conseguindo controlar o mercado. No entanto, isto revelou-se uma má medida porque os jogadores viram-se impedidos de jogarem com jogadores de outros países. Já medidas mais recentes, como é o caso da Espanha prometem ser mais sensatas e promissoras para todas as partes.

Lei americana

Até 2006, o congresso americano trabalhava, sem sucesso, numa forma de legalização do poker online. Na administração Bush, aparentemente um número crescente de pressões direccionou as coisas noutro sentido. Aproveitando algumas críticas sobre a passividade do governo face a crimes financeiros e desviando a atenção do incómodo em que se estava a tornar a questão do Iraque, uma facção de congressistas conseguiu convencer os restantes de que o poker era uma actividade de lavagem de dinheiro de outras actividades criminais.

Foi neste contexto que surgiu a UIGEA (Unlawful Internet Gambling Enforcement Act) que resultou num bloqueio dos fluxos financeiros às casas de poker. Bancos virtuais como o Neteller passaram um mau bocado, mas conseguiram sobreviver sob compromisso de quebrarem os fluxos financeiros com os americanos. O saneamento de fundos ficou comprometido e, face a fortes sanções previstas agora na lei federal, a maior parte dos sites decidiu abandonar o mercado.

Se a motivação para esta medida fosse a de fazer valer os direitos do governo americano sobre impostos, eu percebia, mas nesta altura, é bastante consensual que esta lei foi provocada pelo lobby dos casinos que estavam a ver a sua cota de mercado cada vez mais diminuída.

Excepções e dificuldades nos pagamentos

As maiores casas de poker (Pokerstars e Full Tilt) não estavam na disposição de abandonar o seu maior mercado e, criativamente arranjaram formas de fazer os fundos fluir através de processos bastante rebuscados.

A grande maioria dos jogadores nem sequer experimentou a dificuldade em que se tornou o levantamento de fundos dos sites, mas quem o experimentou soube que precisava de várias semanas para ser pago. Mais recentemente, a Pokerstars foi até acusada de ter comprado um banco para facilitar os seus movimentos.

Sabia-se que a Pokerstars e Full Tilt não estavam a cumprir as leis federais americanas e esta situação poderia ocorrer a qualquer altura.

Vamos ficar sem o dinheiro?

Agora que o DOJ acusou formalmente os donos das casas e os responsáveis pelos pagamentos americanos e emitiu mandatos de captura com FBI e Interpol envolvidos, penso que ninguém sabe muito bem o que pode acontecer. O que se sabe é que o cerco é grande e que o DOJ reclama uma indemnização de 3 biliões de dólares.

Os jogadores americanos têm várias razões para estarem preocupados, não só estão impossibilitados de jogar como têm os seus fundos retidos e sem que os possam tirar, pelo menos para já. Quanto aos Europeus, não têm razões para desesperar para já. Ainda existe um volume de jogadores muito significativo nestas casas e os fundos deverão estar seguros.

Obviamente que estas casas têm a grande maioria dos seus fundos na Europa. Para além disso, são empresas de Biliões. Para se ter uma ideia, a última estimativa que li dizia respeito a 2007, mas apontava-se para lucros diários na ordem dos 4 milhões só na Pokerstars.

O melhor cenário para os jogadores talvez seja um acordo. De qualquer forma, mesmo que não seja possível, muitos processos vão correr nos tribunais e até haver decisões finais, as casas vão querer operar normalmente.

Oportunidade para a concorrência

Independentemente do desfecho, a Pokerstars e a Full Tilt vão perder cota de mercado e isto significa uma abertura para a concorrência. Se conseguirem aumentar significativamente o seu volume, pode-se gerar um fenómeno de feroz concorrência entre as casas menores e isso significará mais promoções e melhores condições para os jogadores.

Liberdades

Independentemente das motivações, o certo é que quem fica a perder são os americanos que se vêm inibidos de jogar livremente na Internet. De resto, esta política de moralidades não é nova, quer para democratas quer para republicanos. Acham-se no direito de definir o que é certo e errado. Este caso nem tem gravidade se comparado com a política externa desse país que, a troco de argumentos nada convincentes praticaram algumas das maiores atrocidades que a humanidade já viu como sendo as bombas atómicas, o Napalm no Vietname, entre muitos outros.

Como foi já dito por algumas personalidades, este episódio pode até ser uma oportunidade para legalizar definitivamente o poker online nos Estados Unidos. A História mostra-nos que, sempre que foram colocadas em causa liberdades, o povo acabou por triunfar e se, neste caso, a liberdade ainda não está garantida, é porque esta história ainda está longe do seu fim.

Tomé tcmoreira Moreira jogador profissional da Betfair Poker

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